Independente de dar certo ou não, o texto do abaixo-assinado explica muito bem o problema das urnas eletrônicas brasileiras e de como o TSE conduz o processo eleitoral. Por isso mesmo, resolvi transcrever abaixo os trechos mais relevantes deste texto.
Boa leitura !
"Os maiores interessados na segurança das eleições, como os partidos e os candidatos, nunca questionaram a integridade dos sistemas utilizados."
Isso foi o que o TSE disse à Folha de São Paulo, no último dia 25 de outubro, véspera do segundo turno, reafirmando "a segurança de todos os sistemas da urna eletrônica".
Parece fazer sentido, não? (...) Seria ótimo, se não fosse falso.
- O PTB reclamou: em 2007, o PTB de Alagoas apresentou relatório do professor Clovis Torres Fernandes, da Divisão de Ciência da Computação do ITA, sobre irregularidades nos arquivos de logs das urnas utilizadas nas eleições para governador do estado em 2006. De acordo com o laudo técnico, os votos de mais de 22 mil eleitores não constavam nos arquivos das urnas;
- O PT reclamou: em 2008, o Diretório do PT em Apucarana (PR) solicitou os arquivos logs das urnas à Justiça Eleitoral e detectou que urnas usadas nas eleições haviam sido ligadas entre a sessão de carga, após a qual as urnas são lacradas, e o dia anterior às eleições;
Engrossando a lista dos que já questionaram os sistemas, o PSDB também entrou, no último dia 30 de outubro, com um pedido de auditoria do processo eleitoral junto ao órgão, derrubando de vez a versão do TSE.
- O PSB reclamou: antes do 1º turno das eleições de 2014, o PSB/RJ protocolou uma solicitação ao TRE/RJ para que um perito indicado pelo partido pudesse realizar análise por amostragem das urnas eletrônicas antes e depois da votação.
O que diz a ciênciaO Brasil usa um tipo de urna eletrônica chamada DRE, do inglês Direct Recording Electronic: urnas deste tipo registram o voto de maneira exclusivamente eletrônica.
Por não criarem evidência física do voto, todas as urnas do tipo DRE, não importa o fabricante ou modelo, estão sujeitas a fraudes em larga escala que podem ser feitas sem deixar vestígios. Não há com o que comparar o resultado, então é impossível saber se ele está correto ou não.
Desde que este tipo de equipamento foi introduzido em vários lugares do mundo, pesquisadores encontraram tantos problemas e falhas de segurança, que todos os países, exceto o Brasil, abandonaram seu uso. Na Alemanha, urnas DRE são inconstitucionais.
É consenso científico: nenhuma urna DRE é capaz de proteger a integridade e o sigilo do voto.
O Brasil, porém, segue usando-as, e o TSE continua afirmando que são seguras.
Em 2012, Diego Aranha, então professor da UnB (atualmente, professor da UNICAMP), encontrou falhas gravíssimas de segurança na urna eletrônica. Essas falhas, confirmadas pelo Ministério Público Federal, dão brecha à violação do sigilo do voto e à adulteração do resultado final.
As vulnerabilidades foram encontradas pelo pesquisador em testes organizados pelo próprio TSE. Os resultados foram esmiuçados em relatório enviado ao órgão e em publicação científica internacional revisada por pares.
Novos testes, que serviriam para confirmar se as falhas haviam sido de fato corrigidas, foram suspensos pelo TSE este ano.
Fora de controleA raiz do problema é que, para todos os fins práticos, o TSE não está sujeito a nenhum tipo de controle democrático.
O mesmo órgão especifica o equipamento, desenvolve o software, regulamenta o processo em resoluções, executa a logística das eleições e julga denúncias de crime eleitoral e pedidos de auditoria.
O conflito de interesses é claro: qualquer crítica ao processo eleitoral será julgada pelo próprio responsável por ele. Como podemos esperar qualquer tipo de imparcialidade?
Este conflito não é hipotético:
- Em 2006, João Lyra, então candidato pelo PTB, pediu ao TSE que investigasse irregularidades nos registros eletrônicos dos votos. O TSE respondeu que técnicos indicados pelo próprio órgão realizariam "perícia administrativa" e que a análise, no valor de R$ 2 milhões, deveria ser paga pelo autor da solicitação, o qual não poderia indicar técnicos que o representassem. A perícia independente acabou não acontecendo, e o denunciante ainda foi multado por "litigação de má fé" após se recusar a pagar pela perícia nos termos do TSE.
- Em 2012, ao receber relatório técnico com as falhas encontradas pelo Prof. Diego Aranha, o órgão afirmou que haviam sido consertadas, mas não sentiu a necessidade de apresentar evidências. Em vez de agradecer ao pesquisador, que fez trabalho especializado de graça, acusou-o: descobrir e divulgar à sociedade as falhas seria "ameaçar a democracia".
Em outros países, como nos EUA, o equipamento e o software de votação são licitados pelo Executivo. Se há questionamentos sobre a segurança, o Judiciário é livre para suspender contratos, emitir multas e rever resultados. O Legislativo determina livremente que tipos de equipamentos podem ser usados e estabelece regras para as licitações.
- Neste ano, 2014, o PDT (base aliada da Dilma) apresentou novas suspeitas de irregularidades ao TSE, peticionando que as investigasse. A resposta? "As informações prestadas pela área de Tecnologia da Informação do TSE [a mesma que desenvolve o software sob suspeita] demonstraram, à sociedade, a absoluta inverossimilhança das apontadas falhas, respondendo, com segurança, a todos os questionamentos deduzidos pela peticionária (...)." As respostas da equipe técnica sequer foram publicadas.
Isolado de qualquer necessidade de prestação de contas, o órgão, além de automaticamente julgar que está sempre certo, se enxerga como sinônimo da própria democracia, e vê como ameaça a ela qualquer questionamento a si.
Os maiores interessados(...) os maiores interessados na segurança das eleições não são os partidos e candidatos, são os eleitores.
Somos nós que votamos, e somos nós que exigimos saber como nosso voto é contado.
Auditar o processo eleitoral é uma necessidade constante, independente de denúncia.
O TSE se esqueceu do eleitor, para quem trabalha. Obcecado pela urna que criou, redefiniu sua missão como sendo a de defendê-la, custe o que custar, ainda que sofra a própria democracia. Não podemos deixar que continue assim.
A auditoria da votação eletrônica, porém, é uma causa de toda a sociedade. É algo que vem sendo exigido por cientistas, cidadãos e partidos de diferentes orientações há muito tempo, e não dá mais para empurrar com a barriga.
Foram 18 anos até que o tema finalmente chegasse ao debate nacional. A mobilização da sociedade civil e o resultado apertado contribuíram crucialmente para colocar em evidência a fragilidade do modo como contamos nossos votos. Não podemos desperdiçar essa oportunidade histórica. Depois das eleições, o tema perde interesse, e precisaremos de mais uma década até que o assunto volte a ter o mesmo alcance.
Como eleitores, independente de orientação, o que precisamos é garantir que a auditoria do processo eleitoral seja profunda, extensa, independente e aberta, para que as nossas próximas eleições (que estão logo ali) sejam, pela primeira vez, transparentes.
O que você pode fazerNesta terça-feira, dia 4 de novembro de 2014, às 19h, o TSE se reunirá em plenário, e pode acolher ou rejeitar o pedido de auditoria. (Você pode ler o texto do pedido aqui.)
Apesar da imparcialidade que se esperaria de um tribunal, ministros do TSE já vêm falando publicamente que se opõem ao pedido de transparência. Precisamos lembrá-los de que é para os eleitores que eles trabalham, e que isso é algo que eles devem a nós, antes de a qualquer partido.
Nós, do Você Fiscal, iniciamos esta petição para fazer pressão e precisamos da sua ajuda: "Por uma auditoria técnica, suprapartidária, independente e aberta da votação eletrônica".
Além de assinar a petição, por favor, faça um pequeno esforço e ligue para o TSE.
Independente de orientação partidária, somos todos eleitores. Temos pouquíssimo tempo e precisamos nos unir para ter certeza de que seremos ouvidos.
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